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Os tempos são outros

8 de Setembro, 2020

Se ontem se dava valor à força, à integração nas diversas caixas do socialmente aceite (um curso superior, uma família, um carro, uma casa, etc.), hoje dá-se valor a algo muito diferente. Ganha valor a capacidade de inovação, de empreendimento individual, a criatividade, o saltar fora das caixas e o ter a coragem e as ferramentas para o fazer, a autoconfiança e vivência em leveza e realização. A capacidade de responder aos gritos da Civilização e da Terra, e a capacidade de saber qual o nosso dom, e de como o podemos por ao serviço da Humanidade.

Esta tomada de consciência muitas vezes vem de um percurso de autoconhecimento. É quase inevitável chegarmos a uma fase da nossa vida onde vamos questionar. Questionar o sentido das nossas vidas, dos nossos trabalhos, dos nossos dia-a-dias, dos nossos padrões, do nosso propósito. 

Em paralelo, com a vivência com as nossas Crianças, o questionamento leva-nos necessariamente a questionar de que forma poderemos contribuir para que elas possam crescer e desenvolver com um conjunto de ferramentas e autoconhecimento que as possam conduzir para uma vida verdadeiramente com sentido, talvez de forma diferente do que aconteceu connosco.

E aqui é inevitável questionarmos a Educação. 

O que correu melhor e pior com a nossa Educação e que determinou quem somos hoje?

De que forma o Sistema de Ensino e a cultura da Educação foram determinantes no estabelecer dos nossos comportamentos, das nossas formas de reagir perante as mais diversas situações que a vida nos coloca pela frente, da nossa relação connosco próprios e com os outros?

As pedagogias alternativas, quando baseadas em fundamentos sólidos e científicos sobre desenvolvimento infantil e humano, permitem não só esta tomada de consciência, como nos fornecem uma resposta para o caminho que queremos trilhar com as nossas Crianças. 

Focando-nos aqui no Método Montessori, é fascinante compreender como Maria Montessori observou as Crianças, e de que forma com base nessa observação científica compreendeu verdadeiramente, do ponto e vista biológico e espiritual, como esse desenvolvimento se processa. Quais as suas necessidades em cada momento. 

E esta compreensão holística da Criança com base numa visão totalmente renovada da sua realidade e da sua natureza, permitem-nos introduzir reais mudanças rumo a uma Educação que a guiará pelo caminho que verdadeiramente desejamos para elas, mais do que nunca. 

Esta tomada de consciência permite-nos fazer a diferença. Permite-nos compreender o que não somos nós em tantas atitudes que temos com as Crianças e que não vão de encontro ao que acreditamos, e permite-nos também mudar radicalmente a forma como gerimos o desafio de educar diariamente. 

Reparem. 

E se a partir de hoje nunca mais olhássemos para as birras como caprichos ou insubordinações descaradas das Crianças, mas como pedidos de ajuda? Ao tomarmos consciência da natureza humana das Crianças, compreendemos que elas não têm a capacidade de fazer birras só porque sim. As suas birras espelham necessidades não satisfeitas. De que outra forma poderiam elas reagir? De que outra forma poderiam elas comunicar essa necessidade? Não sabem, nem dispõem, de outra forma. E Maria Montessori faz-nos o convite: quando acontecem situações de “birras” ou “desespero da Criança (como nos sugere Gabriel Salomão), o que falhou no ambiente físico ou humano para isso?

Reparem. 

E se partir de hoje percebemos que a capacidade de obedecer não é algo inato, que nasce connosco, mas sim uma capacidade que se desenvolve durante os primeiros anos de vida? Se tivéssemos esta consciência, talvez não fossemos encarar as desobediências das Crianças, sobretudo das mais novas, como afrontas à nossa autoridade. Porque, na verdade, não são. A Crianças passa a ser capaz de alguma obediência por volta dos três anos de idade, até lá o que temos são ilusões de obediência, que espelham uma eventual coincidência de vontades (a nossa e a delas), ou uma vibração de medo. E se soubéssemos que há formas concretas de potenciar e promover o desenvolvimento da vontade, como por exemplo, através da criação de oportunidades de escolha? Ou através da consistência nas opções das Crianças para que possam sentir a importância das escolhas, a importância de refletir sobre elas. Que tesouro lhes vamos estar a dar para a vida?

E reparem ainda…

E se a partir de hoje não voltássemos a interromper uma Criança que se concentra? Se tivéssemos consciência de que uma Criança que se concentra está em profundo trabalho interior, está a exercer uma ginástica mental que a irá fortificar, mas não só. Um trabalho que se permitirmos que seja feito sem interrupções verdadeiramente desnecessárias, irá contribuir para um muito maior equilíbrio emocional da Criança e seu bem-estar. E porquê? Porque a sua natureza está a ser respeitada. Um bebé concentrado num objeto, uma Criança que está a tirar os livros da prateleira um a um e a coloca-los em fila, uma Criança que está a encher e desencher a mesma garrafa vezes sem conta na banheira. Temos mesmo de interromper?

E se a partir de hoje assumíssemos o compromisso de compreender o que verdadeiramente se passa dentro da Criança em cada fase do seu desenvolvimento?

E se partir de hoje adaptássemos o ambiente às suas concretas necessidades?

E se partir de hoje procurássemos identificar os gatilhos que nos fazem reagir de forma desproporcionada e desrespeitosa com as Crianças?

E se a partir de hoje fossemos capazes de compreender, no nosso passado, o que nos fez ser ou reagir de determinada forma com elas?

E se partir de hoje fossemos capazes de as tratar como seres que estão ao mesmo nível que nós?

E se a partir de hoje conseguíssemos saltar fora do nosso pedestal autoritário de adulto?

E se partir de hoje tivéssemos a capacidade de escutar as Crianças e compreender que elas são muito, mas muito mais capazes do que na verdade julgamos?

Como seria a vida das Crianças?

Em que Adultos se tornariam amanhã?

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