Foi com enorme prazer que fomos desafiados a ler o livro de Cristina Tébar “Educar com o Coração – Pedagogia Montessori em Casa”, também autora do Blog Montessori en Casa. Um livro claro e de fácil leitura, que fornece uma primeira e ampla visão do que trata esta Pedagogia e a sua aplicação em casa.
Quisemos saber mais sobre o seu caminho com o método Montessori, e desafiamos-la, desta vez o Jardim da Descoberta, a responder a algumas questões sobre o livro e sobre a aplicação do método em casa.
Como foi o seu primeiro contacto com a Pedagogia Montessori?
Quando o meu filho mais velho nasceu comecei a seguir blogs sobre maternidade e crianças, e a procurar no pinterest actividades e jogos para fazer com ele em casa. Via muitas actividades “de inspiração Montessori”, o que me deu alguma curiosidade, assim decidi investigar um pouco mais e comecei a ler blogues e livros sobre Montessori.
Qual tem sido o seu percurso dentro da Pedagogia?
No início os materiais chamaram-me muito a atenção, especialmente os da área das matemáticas, mas à medida que fui lendo e aprendendo mais, dei conta de que havia muito mais por detrás daqueles materiais, e a filosofia Montessori agarrou-me. O meu blog é a minha forma de transmitir o que é Montessori e tem evoluindo, no princípio gostava de compartilhar actividades, tutoriais para fazer materiais caseiros, ideias para criar o ambiente preparado em casa … mas rapidamente fui-me centrando mais no aspecto tangível mais importante de Montessori, que é como integrar a sua filosofia, e a transformação que devemos realizar em nós adultos para acompanhar os nossos filhos.
No início do seu percurso Montessori conhecia alguém que também aplicasse o método?
Ao princípio só conhecia as bloguers que comecei a seguir como a Kylie D’Alton Kavanaugh do “The Kavanaugh Report”… Mas não conhecia pessoalmente ninguém que aplicasse o método, nem sequer que tivesse ouvido falar dele. Como as coisas mudaram em cinco anos! Agora vivo rodeada de pessoas que aplicam Montessori em casa com os seus filhos!
Como reagiram as outras pessoas a esta sua paixão por uma Pedagogia de ensino diferente da convencional?
O meu marido foi o primeiro a apoiar-me, não é que desde o início estivesse tão entusiasmado como eu, mas tudo o que lhe ia contando também lhe fazia sentido e ele percebia, e a pouco a pouco foi-se convertendo num super fã de Montessori.
O resto da família (tios, avós,…) demoraram um pouco mais a entender o que era isto de não utilizar castigos ou de preferir brinquedos sem pilhas, ou de deixar as crianças comerem sozinhas, e deram tudo como perdido!
De que forma acha que a educação pode influenciar a Paz no mundo?
Creio que o que somos como adultos é um reflexo do que vivemos na infância, assim, para mim é muito clara a relação entre a educação que as crianças recebem e o que farão amanhã no mundo. Se educarmos as crianças com valores como o respeito e a cooperação, levarão esses valores com eles quando forem adultos, e as suas decisões serão guiadas por esses valores, o que fará com que o mundo seja um lugar melhor.
Se tivesse que indicar três leituras para quem se está a estrear neste caminho quais indicaria?
Fica muito mal recomendar o meu próprio livro? Piadas à parte, o meu livro é o que eu queria ter lido quando comecei o meu caminho, tive esta ideia em mente o tempo todo enquanto o escrevia. Assim sendo, parece-me um bom primeiro passo, mas sem dúvida a minha recomendação para quem quer aprofundar o método é ler a própria Maria Montessori, mais concretamente gosto de recomendar “A Mente Absorvente” e “A Criança, o Segredo da Infância”, parece-me que estes dois livros contêm a maioria das suas teorias. Pessoalmente também gosto muito do “Educação e Paz”, mas talvez não como primeiro livro, apenas depois de ter lido algo sobre Montessori.
De que forma Montessori mudou a sua vida?
De cima a baixo! Montessori mudou a minha forma de ver a base da educação assim como a vida no geral. Digo sempre que eu não apliquei a filosofia Montessori só com os meus filhos, mas também comigo mesma, e acredito que fez de mim uma pessoa diferente e melhor.
Para além de Maria Montessori, quem são as suas grandes referências?
Gosto muito de Shefali Tsabary, Ken Robinson, Gottman e Goleman, Jane Nelsen, Scilla Elworthy … Acredito que todos têm coisas muito interessantes para dizer e além disso têm a capacidade de transmiti-las de uma forma muito forte.
Como foi o início da aplicação de Montessori em sua casa?
Primeiro interessei-me muito pelo ambiente preparado, comecei por pequenas alterações como colocar um cabide à entrada com a altura do meu filho, e pouco a pouco fomos incorporando mais alterações, depois comecei a ler e a aprender mais sobre a filosofia Montessori e a incorpora-la de forma natural na forma de relacionar-me com o meu filho.
O seu companheiro ajudou desde o início ou inicialmente não entendeu bem do que se tratava?
Ao princípio não estava tão entusiasmado como eu, mas também não era contra tudo o que lhe ia explicando e as modificações que íamos fazendo, mas pouco a pouco começou a entender o porquê de todas as alterações e a partilhar do meu entusiasmo por Montessori.
Estudou outras pedagogias ou Montessori foi amor à primeira vista?
A verdade é que foi amor à primeira vista. Li sobre outras pedagogias e filosofias como Wardorf, Reggio Emilia, Pikler … Mas não cheguei a aprofundar estas da mesma forma como fiz com Montessori.
No livro diz-nos “Esperança – no desenvolvimento da criança e na sua bondade. É importante ter clara a ideia de que uma criança que revela um mau comportamento não é má, simplesmente encontrou muitos obstáculos no seu processo de desenvolvimento e a atitude que revela não passa de uma chamada de atenção e de um pedido de ajuda.”
No seguimento deste excerto, acreditamos que tenha aplicado o método com os seus filhos o máximo possível. Eles alguma vez apresentaram atitudes que veio a perceber que se tratavam de chamadas de atenção ou pedidos de ajuda? Se sim, que situação pode partilhar connosco.
Claro que sim, em muitas ocasiões! Um exemplo muito claro e que repetimos muitas vezes é quando estamos com pressa e não posso deixar a minha filha (de 3 anos e meio) fazer as coisas ao seu próprio ritmo, como vestir ou escolher a sua roupa, por exemplo. Nestes casos em que eu peço para que se despache muitas vezes a reacção dela é irritar-se e recusar fazer qualquer coisa ou até mesmo jogar-se ao chão a chorar, e eu sinto que essas situações são pedidos de ajuda, como se estivesse a dizer “Eu preciso de mais tempo para fazer isto, se me pedires para fazer mais rápido eu bloqueio!”
Os seus filhos frequentam uma escola Montessori?
Sim, temos a sorte de há três anos ter começado um projecto Montessori em Almería (Montessori School Almeria), e nós fizemos um grande esforço a nível económico e logístico (tivemos que nos mudar para outra cidade), mas sentimos-nos afortunados por ter esta oportunidade.
No seu país a educação Montessori é possível no ensino público?
Existem escolas públicas que estão a apostar em Montessori e estão a treinar professores e a fazer mudanças nas salas de aula e na forma de trabalhar, mas, por enquanto, são uma minoria e geralmente têm dificuldade em fazer Montessori a 100%. Por exemplo, a questão de ter as idades misturadas numa sala de aula muitas vezes é complicada. Mas é um primeiro passo essencial para que, pouco a pouco, Montessori tenha mais presença na escola pública, que é o objectivo ideal, para que qualquer família que deseje uma escola Montessori para os seus filhos possa tê-la ao seu alcance.
De todos os ensinamentos deixados por Maria Montessori, nomeie três que para si são a base.
Seguir a criança, educar para a paz, e ter o respeito como valor essencial na vida.
Como está a correr o livro? Nota que as pessoas estão cada vez mais interessadas no método? Tem recebido muito contactos por parte de famílias que querem começar a utilizar o método?
A verdade é que o livro está a correr muito bem, havia livros sobre Montessori destinados a famílias em inglês, mas não em espanhol ou em outras línguas, como o português, de modo que as famílias o receberam muito bem. Na Espanha, a sétima edição acaba de sair e, além do português, é traduzido para italiano, romeno e chinês. Nunca imaginei que fosse tão longe, mas agrada-me que mais e mais famílias se interessem por novas formas de educar através de Montessori e de outras pedagogias alternativas, é um sinal de que estamos a abrir os olhos e a descobrir que não há necessidade de nos contentarmos com o “costume”, que podemos reconsiderar a forma de como vemos a infância, a aprendizagem e a vida em geral.
Sim, recebo muitos e-mails de famílias que desejam começar com Montessori. Como eu acho quase impossível responder a todos os e-mails que recebo, há algum tempo criei um pequeno curso online gratuito para a introdução a Montessori (www.cursosmontessoriencasa.es/gratis), dirigido àqueles que ainda não estão certos de comprar o livro ou não, assim podem conhecer o essencial de Montessori e decidir se se identificam com o método ou não.
Um livro que vale a pena ler e um blogue que vale a pena seguir! Obrigado Cristina!
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